quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Day 18 - As time goes by...

Buenos Aires - 06:00

Dia de regresso a Portugal. Fim de aventura. Capout. No more. Finito.

São 07:00 e encontro-me a caminho do aeroporto. O taxista é um senhor idoso mesmo old school. Abre a porta, encontra-se de colete, super expressivo, catita e orgulhosamente argentino.

Paramos num semáforo. A passadeira é atravessada por um grupo de miúdas que regressam de alguma discoteca. Completamente com os copos, vão arrastando as suas mini-mini-saias perpetuando a sua triste figura em fotografias desenquadradas tiradas na hora.

O taxista reclama. Abana a cabeça e olha para mim à procura de um comentário. Sorrio e benzo-me para ele.

Aeroparque Jorge Newbery. Mais virado para voos domésticos e...brasileiros. Encostamos, 80 pesos conforme combinado mas não tenho o dinheiro certo, nem o homem troco. Dá-me a diferença em reais. Faço uma rápida conta e creio que não me está a tentar enganar muito. São 07:30 e não quero começar o dia a discutir em castelhano (ou será argentino?).

Check-in. Despeço-me da minha mala e desejo-lhe boa sorte enquanto parte em direcção a Lisboa. O itinerário de hoje levar-me-á num voo de três horas até São Paulo, mais três horas de espera nesta cidade, até apanhar o voo da TAP até Lisboa (praticamente dez horas).

O mamute que se encontra no balcão de check-in informa-me que apesar de a bagagem ficar despachada até Lisboa, terei que fazer novo check-in em São Paulo. Por que raio isto não me soa bem?...

Ainda "queimado" da experiência/seca com os serviços de emigração em Lima, dirigo-me rapidamente para as portas de embarque. Aqui, começa todo um belo episódio digno de um filme.

Raio-x. Verificação do cartão de embarque por um segurança. O polícia a seu lado - puto novo com ares de armado em campeão - pergunta-me para onde vou. Respondo: "destino final: Lisboa, Portugal (não tem ar de saber onde fica...)".

Enquanto passo a bagagem de mão pelo raio-x, reparo que o puto polícia aproxima-se de outro segurança e diz-lhe algo. A partir daqui já sei o que vai acontecer.

Tiro a bagagem de mão e um segurança mais idoso aproxima-se de mim. "Fazia o favor de me acompanhar?" (não sei como se diz em castelhano mas era isto...).

Como se uma pessoa tivesse alternativa...

Vou tranquilo até um balcão mais privado e longe dos olhares indiscretos.
Verificação do passaporte e começa o interrogatório. "Para onde vai? Donde vem? Quanto tempo esteve no Peru? O que foi fazer ao Peru? Por onde andou por lá? E em Buenos Aires? O que veio cá fazer? Quem é essa sua amiga? Onde mora a sua amiga? Onde é que você ficou hospedado? Quanto tempo ficou cá? Por que sítios andou em Buenos Aires?"

Vou sorrindo e respondendo. Até acho uma certa piada à coisa. Pergunto-me o que ele terá achado dos carimbos do Dubai e dos Estados Unidos no meu passaporte... provavelmente reforçou-lhe a ideia de eu ser um perigoso traficante de droga.

Desconfiado, pergunta-me com um sorriso fraternal "occupación?".
Respondo com outro sorriso "abogado!" (apenas invoco a minha antiga profissão quando me dá jeito)...

O senhor fica aparvalhado. Pisca os olhos. Olha melhor para mim. Barba por fazer, todo maltrapilho, de mochila às costas e cara de puto.

"Tienes un comprobativo?". Saco da minha cédula profissional.

A partir daqui o nível de surrealismo aumenta. Examina a cédula e começa a rir. Chama os seguranças todos. O raio-x fica abandonado, o polícia puto vem a correr. Mostra a cédula a todos dizendo "olha como se escreve advogado em português!". A cédula passa de mão em mão, todos curiosos, todos a olharem para mim. Onde raio me vim meter?

Deixam-me ir em paz rapidamente entre sorrisos e votos de boa sorte e viagem. Fuck, bem que podias ter perguntado a "occupación" logo de início!

Passa a emigração. Novamente um mamute mas este nem fala. Melhor assim. Tiro os óculos, sorrio para a câmara e pergunto-me que raio eles fazem com o registo de fotos. Aposto que iria ficar o máximo como foto de perfil no Facebook.

Como ainda tenho uma hora até o embarque dirigo-me até ao Duty Free. Fiquei de levar dulce de leche para uma amiga e aqui é bem mais em conta. Procuro e encontro. Verifico o rótulo "650 gramas". Gramas. Estava com receio que pudessem implicar se a coisa estivesse em litros e fosse efectivamente líquida. A ver vamos...

São 10:30 e o Embraer 190 rola na pista activa. Volta pela esquerda em direcção ao rio plata e não consigo vislumbrar Buenos Aires uma vez mais de cima. Em compensação, vou explorando o ecrã individual que a Austral Airlines me proporciona em económica. Escolho os Simpsons e "How I met your mother". Refeição quente, nada mau para um voo de três horas. Comparo tudo com a última experiência na Europa num voo de duração semelhante (Funchal-Londres na TAP). Parto-me a rir...

Ao meu lado, um casal idoso argentino-brasileiro-espanhol. Ao preencher o papel da imigração brasileira, o senhor topa que sou português. Tou tramado. É galego. Faz logo uma grande festa. Descobre que sou da Madeira. Maior festa ainda. Diz que adora a ilha e que quer lá voltar em breve.

Não deixa de ser curioso. Mesmo no Peru, o conhecimento de Portugal e dos portugueses é generalizado (em contraste com o que se passa noutros países ditos desenvolvidos, ex: States..) e mais curioso ainda, todos os com quem me cruzei (excepção ao Elias), conheciam/sabiam da Madeira, elogiavam-na (chup* Merkel...) e faziam uma grande festa, até a guia Liz em Arequipa. Olho para os meus botões e pergunto-me se o nosso país não é demasiado atrasado em termos de mentalidade, se não nos maldizemos em demasia e damos pouco valor ao que é nosso. Creio que com este capital de popularidade, devidamente explorado em termos turísticos, a recuperação económico-financeira de Portugal seria acelerada (isto depois de termos instaurado a IV República, I República Miguevariana), em particular, com esta popularidade e imagem inatacável da Madeira junto dos estrangeiros com quem me tenho cruzado nos últimos tempos (que, ao contrário dos meus amigos continentais e restante cambada, ignoram questões políticas corriqueiras e dão valor ao que é essencial e que nenhum buraco pode engolir...). Enfim mas isto são devaneios para outras paragens.

"Nos blocos" à hora certa e desembarque. De volta a São Paulo Guarulhos. Provavelmente o aeroporto mais feio que existe no mundo.

À saída procuro indicação das transferências. Benzo-me (bolas, tou a ficar religioso??). Uma rapariga simpática explica-me: devo passar a segurança e esperar na porta de embarque que o pessoal da TAP me dê um cartão de embarque. Fuck. Que raio de sistema marado é este? O meu único comprovativo de viajante é o talão da bagagem. Guardo-o bem guardadinho.

Segurança. Duas monas com ar de burras. Isto vai dar m*rd.. Bingo! A lôraburra que olha para o ecrã dá um pulo. "Nossa!". Já sei o que aí vem ou aliás, vai... Adeus dulce de leche. Ainda tentei argumentar que aquilo não era líquido, que a embalagem estava em gramas conforme o rótulo. "Ahh é muitxo grandiii!" (sim filha, eu sei...). Nada feito. Tenho de investigar isto melhor. Pergunto-lhes se também querem os bombons. São mais 450 gramas! Mais tarde verifico as regras internacionais. Por "líquidos" incluem-se eventuais "pastas" (creio que podia enquadrar aqui o doce de leite) mas as embalagens têm que expressar-se (e os limites são impostos) em litros/mililitros.

Guarulhos. Tenho de mudar de terminal. Como tenho tempo arrasto-me. Sigo as instruções da rapariga das transferências e percorro o terminal 1 de uma ponta à outra. Não há nenhuma indicação de como aceder ao terminal 2. Revejo as instruções e refaço o percurso. Desisto e pergunto a uma outra funcionária com ar minimamente simpático. "Volte tudo para trás e depois tem umas escadas num canto. É só subir!".

Magnífico. Guarulhos além de ser feio, é incrivelmente disfuncional. Quem vem das transferências e chega ao terminal 1, fica imediatamente de costas para o acesso ao terminal 2, sendo que, em qualquer caso, não existe indicação deste junto das ditas escadas escondidas a um canto.

Chego à porta. Passam duas das três horas. Voo atrasado mais uma hora. Bonito. Mudança de porta. Novamente bonito. O avião escalado é o CS-TOB, A340 renovado com ecrãs individuais na económica. Com o atraso e mudança de porta fico logo com um feeling que a aeronave foi trocada à partida de Lisboa por um dos outros chaços velhos.

Na sala de embarque o caos é total. Visivelmente pequena para lidar com tanta gente, ainda falta uma hora e meia para o embarque e os passageiros já fazem fila. Espero que chegue o pessoal da TAP. Finalmente... Não me lhes dirigo de imediato. Decido esperar. "Passageiro Fernando Campos com destino a Lisboa, favô contactar a TÁPi portão 17!". É sempre engraçado ouvir o nosso nome pelos altifalantes do aeroporto...

Cartão de embarque na mão e lugar sentado perdido, encosto-me à parede. Ao meu lado, um espanhol constantemente ao telemóvel. Quando se cala, já eu estou na fila de embarque. Pergunta-me que filas estão a embarcar e cola-se. Mete conversa. Dou-lhe trela apesar de perceber que apenas quer-se colar. Em qualquer caso, como também não vamos a lado nenhum, continuo. É asturiano mas a mãe vive em Lisboa. Vai lá passar um dia antes de ir para Bilbao. Surprise, conhece a Madeira! Nova festa (eu não sou de intrigas caros amigos continentais mas...)!

Encaminhados como sardinhas em lata, chegamos ao A340 que nos espera. Shit. É o CS-TOC. O único sistema de entertenimento a bordo é um ecrã CRT que mal vejo do meu lugar à janela. Retiro um exemplar de todos os jornais disponíveis para me ocupar. O avião em si acusa o desgaste dos anos mas até é bom ouvir português-português.

Ao meu lado senta-se uma moça jovem. Brasileira, vai numa excursão. God, também conhece a Madeira...e esqueceu-se da escova de dentes. Felizmente passa o resto do voo a dormir e não me chateia mais.

Tento fazer o mesmo mas tenho uma dificuldade enorme em dormir num avião. Estico as refeições ao máximo. Os jornais estão mais que despachados. Saco do iPhone e escrevo um par de posts para fazer o upload quando chegar a Lisboa.

São 07:30 portuguesas, 04:30 argentinas e 02:30 peruanas. Volta pela direita, Tejo do lado esquerdo e amanhecer nebuloso em Lisboa. Alinhados, "borrachas ao vento" (ops, já não estamos no Brasil..) e o TOC toca suavemente na pista 21 da Portela.

Desembarque...saio do autocarro para passar o controlo de passaportes e...ok, é o caos completo. Disse caos? Não, é a selvajaria completa. Chegaram os voos todos do Brasil e de África ao mesmo tempo. Pensava que estaria safo pois iria pelas máquinas de passaporte electrónico ou em último recurso pela linha rápida de cidadãos da União Europeia. Errado. Máquinas a meio da fila avariam. Fila gigante transfere-se para a fila comum da União Europeia. Deixa de haver fila e respeito. Ao meu lado uma família típica corre...mas meus amigos, não é para todos, correm de tabuleiro de refeição do voo na mão, devidamente envolto em película aderente. "E mai nada"!

Confirmo. Cheguei a Portugal.

Quando chego - 45 minutos depois - ao tapete atribuído, a bagagem já se encontra disponível. Com muita pouca fé espero...mas milagre dos milagres (terá sido das benzeduras? estou convertido?), a super-mochila aparece imaculada, de laranja resplandecente e...inteira!

Feliz da vida, encaminho-me porta fora! Ninguém me pode parar! Quero chegar rapidamente a casa para dormir devidamente pois tenho novo voo às 23:00 para o Funchal.

Ninguém, ninguém, não...
"Nada a declarar". Pois é, não queria prestar declarações mas queriam falar comigo.
Here we go again...

"Bom dia caro senhor. De onde vem? Pode-me acompanhar?".
Duas senhoras, simpáticas e extremamente educadas. Perguntas do costume. "De onde vem", "quanto tempo por lá ficou"... enquanto vou abrindo os quatro cadeados da super-mochila.
Ainda penso dizer "sou advogado" mas estamos em Portugal, o truque é capaz de funcionar ao contrário.
Felizmente a coisa é rápida. Mal a senhora abre a mochila e sente o pivete a roupa suja, desiste. Revira um pouco as coisas e já há meias sujas a saltarem dos sacos de plástico para o chão.
Problema resolvido.
"Pode seguir! Obrigado!"...

Jogo-me na cama e reponho o sono o dia todo. Creio que não chega...

Nova ida para o aeroporto. Novo voo. Nova aterragem.

São 00:45 quando desembarco e sou bafejado, atormentado, envolvido, pela humidade e calor madeirense. Mal dá para respirar. Aos 5000 metros respirava melhor que aqui mas é bom estar em casa...

Penso no tempo que passou, nas aventuras que passaram e nas pessoas que conheci, enquanto olho melancolicamente para a minha mochila a ser atirada e violada pelo tapete das bagagens.

Lembro-me da conhecida música - "As time goes by..." do filme "Casablanca"...

This day and age we're living in 
Gives cause for apprehension 
With speed and new invention 
And things like fourth dimension.



Yet we get a trifle weary
With Mr. Einstein's theory.
So we must get down to earth at times
Relax relieve the tension

And no matter what the progress
Or what may yet be proved
The simple facts of life are such
They cannot be removed.

You must remember this
A kiss is just a kiss, a sigh is just a sigh.
The fundamental things apply
As time goes by.

And when two lovers woo
They still say, "I love you."
On that you can rely
No matter what the future brings 
As time goes by.

Moonlight and love songs
Never out of date.
Hearts full of passion
Jealousy and hate. 

Woman needs man
And man must have his mate
That no one can deny.
It's still the same old story
A fight for love and glory
A case of do or die.
The world will always welcome lovers
As time goes by.

Oh yes, the world will always welcome lovers
As time goes
by.


THE END!

2 comentários:

  1. Epah, e agora? Já estava a ficar habituado :)

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  2. Ainda falta o posto do debriefing :P E podes sempre adquirir a versão em papel como souvenir lol

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